Isabella: O Caso Nardoni | Até que ponto a mídia deve interferir na justiça?

Spoilers

Se Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal é um bom exemplo da sensibilidade necessária ao transformar o crime em entretenimento, Isabella: O Caso Nardoni é uma análise mais direta da relação entre crime e mídia. O documentário conta a história de Isabella Nardoni, uma menina de quase 6 anos que supostamente caiu da janela em uma noite de 2008. Durante a investigação, o pai e a madrasta alegaram que alguém havia invadido a casa e a jogado pela janela enquanto tiravam os outros dois filhos do carro. Essa versão não se sustentou por muito tempo e, dois anos após a morte de Isabella, os pais e a madrasta receberam uma sentença combinada de mais de 55 anos pelo assassinato da garota, embora afirmem serem inocentes até hoje.

Contudo, Isabella: O Caso Nardoni não se trata do crime em si, mas, sim, do frenesi midiático que tomou conta dele. Não foi o primeiro caso que chamou a atenção da mídia brasileira, visto que outras crianças já haviam se desequilibrado e caído de janelas antes, mas quando ficou claro que havia um crime envolvido, provavelmente por parte da própria família da menina, o país ficou obcecado pela história. Os noticiários analisavam as declarações dos acusados e alegavam que eles estavam mentindo, sem qualquer embasamento científico. Além disso, a polícia deixou que a mídia tirasse fotos dos suspeitos durante a prisão, e todos os envolvidos no julgamento eram constantemente cercados.

Foto de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá tirada durante a prisão de ambos

Embora Isabella: O Caso Nardoni possa parecer, à primeira vista, uma típica história de crime real, porque examina as reportagens, e não o crime em si, o documentário se diferencia ao forçar o público a questionar se o caso foi tratado de maneira adequada e qual é o papel da mídia no sistema judicial. O documentário evita os detalhes mais sórdidos, mas nos mostra como eles se tornaram o foco dos noticiários na época, moldando a percepção do público em prol da audiência. O final destaca que o pai e a madrasta de Isabella nunca confessaram o crime, apesar do fato de que culpar um ao outro teria diminuído suas penas. Mesmo assim, graças à história que os meios de comunicação espalhou, as multidões do lado de fora do tribunal aplaudiram e choraram de alegria quando a condenação do casal foi anunciada, causando uma catarse geral e fazendo com que os espectadores esquecessem completamente a dor e a perda por trás do caso, já que as vítimas nunca foram destaque nas reportagens.

  Ana Carolina, mãe de Isabella, rodeada por repórteres durante o período mais difícil de sua vida
Ana Carolina, mãe de Isabella, rodeada por repórteres durante o período mais difícil de sua vida

Uma das pessoas que mais me surpreendeu durante as entrevistas para o documentário foi o advogado da defesa que foi adicionado à equipe jurídica na noite anterior ao início do julgamento do assassinato de Isabella. Durante a audiência, ele fez tudo o que pôde para que o casal não fosse linchado no tribunal, visto que diversas pessoas estavam ansiando pela sentença de culpa, que foi constantemente propagada pela mídia ao longo das dezenas de reportagens. O comportamento desses veículos de comunicação foi certo? Será que devemos assumir o papel de juízes? Cabe a nós, enquanto telespectadores, e à mída, como formadora de opinião, decidir quem é culpado ou inocente? Como documentário, a função de Isabella: O Caso Nardoni foi apenas levantar essas questões sobre a interferência da mída na justiça.

Ana Carolina e a filha Isabella em um de seus últimos registros

Isabella: O Caso Nardoni nos lembra do poder da mídia na formação de narrativas populares e na promoção de histórias através de um só ponto de vista, em favor da busca pelo efeito viciante da justiça. Na verdade, é irônico que um documentário da Netflix, que também é um meio de comunicação, esteja criticando o sensacionalismo da mídia, mas pelo menos eles deram mais tempo de tela à família de Isabella do que os noticiários brasileiros na época.

No entanto, Isabella: O Caso Nardoni deveria ter ido mais longe. O documentário força os espectadores a questionar os meios de comunicação, incluindo ele próprio, mas não levanta muitas questões sobre o papel dos consumidores deste tipo de conteúdo. Muitas pessoas gostam de histórias sobre crimes reais, mas depois de testemunhar as multidões enlouquecidas e a família traumatizada, é possível se sentir confortável com isso? Esta é a última questão que o documentário tem vergonha de levantar diretamente: de que lado estamos?

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