Cinéfilos de carteirinha, estamos hoje aqui reunidos para falar de um grande nome no universo do cinema: David Fincher.
Conhecido por thrillers psicológicos, cine-biografias dramáticas, e suspenses por vezes lotados de crimes, sangue, e uma inexplicável, porém certeira sensação de que o terror pode estar aguardando quem assiste seus filmes a cada virada na trama, Fincher é certamente um dos grandes nomes de Hollywood, com mais de 40 indicações ao Oscar, sendo 3 delas na categoria de Melhor Diretor.
Muitos são os adjetivos que vêm à mente para se descrever o estilo do cara: frio, cru, duro, até “desesperançoso” são apenas alguns. Porém a definição mais exata para a produção deste auteur cinematográfico talvez seja “detalhista”.
Fincher é um perfeccionista cuja precisão ao construir histórias, cenários e personagens é realmente do maior calibre, o que, em termos simples, significa que absolutamente nada que aparece em cena está lá por acaso.
Esta característica nos leva à curiosidade em questão que observamos, de cabo a rabo, na filmografia do diretor. Quase como um pintor que assina seu quadro, assim também Fincher criou uma espécie de assinatura cinematográfica pra lá de peculiar e que, na boa?
Só uma figura dessas mesmo… Estamos falando de geladeiras. Sim, isso mesmo. Em mundo de David Fincher, pode não ser nenhum “Toy Story”, mas objetos inanimados falam, sim, e muito! E este eletrodoméstico, especificamente, está por toda parte.
Quer ver como? Se liga nos exemplos!
→ “Clube da Luta” (1999)
- Em “Clube da Luta”, ela aparece pela primeira vez enquanto estamos conhecendo o personagem de Edward Norton. Observe como a câmera está posicionada por dentro da geladeira, de modo que podemos ver o que tem dentro dela (quase nada) e como ela está limpa e organizada. Assim, tanto o posicionamento de câmera, quanto o conteúdo da geladeira e até a paleta de cores da cena descrevem o estilo de vida e personalidade do personagem.
- Mais tarde, quando conhecemos Tyler Durden (Brad Pitt), temos uma nova geladeira, a do QG do Clube da Luta. Repare como esta nova já é bem mais ~gosmenta, porém em termos de “conteúdo” (da própria geladeira e da cena), o que é que vemos? Apenas o fato de que ela pertence a um ambiente caótico e é usada para uma só finalidade- que não é a de conservar alimento…
- No final do filme, quem é que aparece novamente? A própria: a geladeira, que inclusive provocou o curto que causou a explosão do final. “Que vergonha,"- é a fala do Narrador Norton, contemplando o desastre, “uma casa lotada de condimentos, mas nenhuma comida.”
→ “Se7en: Os Sete Crimes Capitais” (1995)
- Em um filme que trata de crimes relacionados aos 7 pecados capitais, não é difícil de imaginar que a geladeira apareceria no contexto da gula, que é bem a tomada que vemos aqui, em que o detetive Somerset (Morgan Freeman) examina a cena do crime.
Mais uma vez, a comida diz muito sobre o estilo de vida do dono do apartamento (no caso, o “culpado/ vítima da gula”). Porém, dessa vez, a geladeira em si também tem o papel importante de “puxar” o detetive de volta para o caso, uma vez que ele, que estava desinteressado e a ponto de se aposentar, acaba encontrando pistas do assassino justamente através do eletrodoméstico. Assim, ela faz um trabalho não só descritivo, mas também influencia diretamente (ainda que de maneira discreta) a trama.
→ “Zodíaco” (2007)
- No caso de “Zodíaco”, lá está a bendita da geladeira de novo, e o uso atrapalhado dela em um ambiente atravancado enquanto inseridos no ritmo da rotina atolada do jornalista Robert Graysmith (Jake Gyllenhaal) indica que a própria estrutura da família também está desorganizada.
→ “O Quarto do Pânico” (2002)
- Aqui, o próprio formato ‘frigobar’, o fato de ele estar ao lado da cama e aparecer bem no início do filme, e além disso tudo, ainda mostrar logo de cara as embalagens de remédios à direita já indicam a importância do objeto. Ele não é meramente decorativo; ele é uma necessidade- e não é à toa que mais tarde no filme ainda vira motivo de mais e mais pânico.
→ “A Rede Social” (2010)
- Neste caso, mais uma vez a geladeira aparece pela primeira vez tipo ‘frigobar’ para que o modelo, somado aos conteúdos, ilustrem o estilo de vida do jovem universitário Mark Zuckerberg (Jesse Eisenberg).
- O interessante, porém, é que ela aparece mais tarde outra vez; só que nessa segunda aparição, indica a progressão cronológica da história e financeira do personagem - que não mais vive de um frigobar, mas agora tem uma geladeira de verdade, e uma casa inteira, após ter criado o Facebook.
Contudo, observe o que a “geladeira de adulto” contém e o jeito como Zuckerberg a trata: ela continua suprida apenas de cerveja e afins, e ele segue sendo um moleque, basicamente. Ou seja, uma geladeira só que pode abrir todo um debate sobre inversão de valores, fama, imaturidade e afins.
Agora que você já sabe o que procurar no próximo filme do Fincher que assistir (ou re-assistir), conta aí- qual objeto você usaria como assinatura artística?
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