Final de Round 6 deixou uma péssima sensação de tempo perdido Spoilers

Eu raramente me arrependo de assistir a algo, mesmo quando o que está na tela não é bom. Mas o desgosto que a terceira e última temporada de Round 6 deixou foi um dos maiores que já senti nos últimos anos. E os motivos para isso vão muito além da simples ideia de que a série realmente não precisava de uma continuação.

Atenção: o texto a seguir contém spoilers de Round 6. Prossiga por sua conta e risco.

O sucesso até aqui

Vejo que o descontentamento com o final é grande entre o público. No meu caso, não me incomodei pelo fato de não haver um final feliz para Seong Gi-hun (Lee Jung-jae) — na verdade, penso que ele sair vivo de seu segundo jogo iria contra a mensagem que a própria série construiu ao longo dos episódios. Eu já esperava um desfecho trágico e dramático para o protagonista, mas a maneira como tudo foi conduzido deixou muito a desejar.

Antes de explorar mais profundamente o que tanto me desagradou no final, vamos voltar a 2021, ano em que a primeira temporada de Round 6 estreou na Netflix. Brutal e diferente de qualquer outra série do serviço, a obra criada e dirigida por Hwang Dong-hyuk quebrou recordes na plataforma de streaming.

De fato, o seriado mereceu a atenção e o sucesso que conquistou. Agora, olhando para trás, penso que, se as produções sul-coreanas não tivessem ganhado tanto destaque mundialmente nos últimos anos, Round 6 talvez nunca tivesse saído do papel. Em entrevista à BBC, o próprio criador afirmou que sua ideia foi ignorada por 10 anos antes de ser aceita pela Netflix.

Felizmente, o mercado audiovisual sul-coreano ganhou ainda mais força no Brasil e no mundo após a premiada temporada de Parasita (2019) nos cinemas. Os famosos K-dramas também já estavam em alta, mas Round 6 conseguiu chamar a atenção de todos — tanto de quem buscava reflexões sobre a sociedade em que vivemos quanto daqueles que só queriam maratonar “a série do momento”. Só se falava na bendita Batatinha 1, 2, 3.

Minha memória não é boa o suficiente para analisar em detalhes o que tornou a primeira temporada tão excelente, mas lembro de ter maratonado tudo em, no máximo, dois dias. Os personagens eram carismáticos e a tensão em cada episódio era sufocante (no bom sentido, claro, já que mantinha meu interesse e atenção o tempo todo).

Bom, caso você tenha chegado até aqui e mesmo assim não saiba do que se trata Round 6, eu explico brevemente: 456 pessoas com a vida lascada (para não falar coisa pior) e necessitadas de dinheiro recebem um convite misterioso para participar de um jogo com uma premiação bilionária. O que ninguém sabia é que a grande maioria dos participantes morreria ao longo das brincadeiras letais.

Seong Gi-hun teve o destino que deveria ter, mas o caminho até lá não foi primoroso. (Foto: Netflix)

Na segunda e terceira temporadas, vemos o vitorioso Jogador 456, Seong Gi-hun, retornando ao jogo com o propósito de acabar de uma vez por todas com a organização criminosa por trás de tudo. E, bom, agora sabemos que ele quase conseguiu o que queria, mas não sobreviveu para contar história — e muito menos para descobrir que o esquema não existe apenas na Coreia do Sul (sim, o tal do remake americano; falarei sobre isso já já).

A segunda temporada não é ruim, mas se estende demais, e o cliffhanger safado do final me desapontou significativamente. Se tivesse mais dois episódios, a terceira nem precisaria ter existido. Por outro lado, os novos personagens haviam me conquistado, e eu ainda estava curiosa para descobrir até onde o jogo iria. Infelizmente, tudo desandou por completo na terceira temporada.

O que deu errado?

A resposta mais curta é: tudo deu errado. A cada novo episódio, minha impressão de que Hwang Dong-hyuk havia perdido o controle absoluto da própria narrativa só aumentava. As reviravoltas eram previsíveis, havia uma porção de furos de roteiro e cenas que beiravam o constrangimento. Aquela tensão marcante da primeira temporada simplesmente não existia mais. Parecia um novelão de péssimo gosto.

Pior do que ser um final desnecessário, a terceira temporada de Round 6 mancha tudo o que a primeira havia construído — não ao ponto de invalidar por completo a existência da série, é claro, mas o suficiente para tornar irrelevante tudo o que veio depois da primeira leva de episódios.

Faltam palavras para explicar o quão frustrada eu fiquei assistindo aos episódios finais. Se o problema se limitasse ao bebê reborn e ao cachorro, ambos terrivelmente feitos em CGI, o saldo até poderia ser positivo. Mas, além da linha temporal absolutamente confusa e sem sentido, as decisões dos personagens beiram o ridículo. Sim, a menina poderia e DEVERIA ter tentado pular corda com um pé só. E não é possível (!!!!!!!!!) que Gi-hun não tenha sequer considerado a possibilidade de ficar sozinho com o bebê no último jogo.

Apesar de considerar o sacrifício do protagonista poético e coerente com a mensagem da série, o roteiro simplesmente não favoreceu essa decisão. Questionei o tempo todo as escolhas mal construídas e a ausência de um desfecho consistente. São dezenas de momentos incoerentes ou absurdos que eu poderia citar aqui, mas basta dizer que terminei o último episódio rindo (de nervoso) e com o desejo de poder recuperar o tempo perdido.

Também acredito que minha frustração tenha sido intensificada por outra percepção que tenho sobre o mercado audiovisual atual: estamos vivendo uma crise de criatividade e originalidade, com remakes, live-actions e sequências que pouco (ou nada) agregam. Essa é uma reflexão que deixarei para outro texto, mas, lá atrás, eu jamais imaginaria que Round 6 também acabaria sofrendo desse problema crônico.

Cho Hyun-ju , você para sempre será lembrada <3 (Foto: Netflix)

Afinal, Round 6 precisava de continuação?

A mensagem universal de que vidas são exploradas pelos mais ricos e poderosos já havia sido entregue com maestria na primeira temporada. Sim, é verdade que a história não foi totalmente encerrada no episódio final, mas também não senti que houvesse uma necessidade real de continuar com aquilo. Ainda assim, não reclamei quando a série foi renovada — afinal, imaginei que a qualidade seria mantida nos capítulos seguintes.

Mas Hwang Dong-hyuk decidiu continuar e em uma entrevista à BBC em 2024, ele explicou brevemente o motivo:

“Dinheiro. Embora a primeira temporada tenha sido um sucesso global enorme, honestamente, não ganhei muito. Então, fazer a segunda temporada vai me ajudar a compensar o sucesso da primeira. E não terminei a história completamente.”

Quem somos nós para julgá-lo, não é mesmo? O cara passou anos buscando alguém para bancar sua ideia e chegou a falir por causa disso. Mas talvez ele mesmo se arrependa da decisão que tomou, apesar de ter conseguido o dinheiro que buscava nos episódios seguintes.

Hwang Dong-hyuk afirma ter perdido cerca de oito ou nove dentes durante as gravações da primeira temporada por puro estresse. E, segundo ele, o cansaço aumentou ainda mais durante a produção da segunda e terceira temporadas, assim como sua visão sobre o estado do mundo, que se tornou ainda mais pessimista. De novo, não o julgo. E, se o assunto é humanidade, acho que sou tão ou até mais pessimista do que ele.

O parto mais rápido e sem complicações já visto na história da TV, mesmo apesar das condições adversas… (Foto: Netflix)

Uma de suas críticas na vida pessoal e na série é a desigualdade social, que parece crescer ainda mais em meio às mudanças climáticas e outras questões que enfrentamos atualmente. Ele disse: "Ao fazer esta série, eu me perguntava constantemente: 'Será que nós, humanos, temos o que é preciso para tirar o mundo deste caminho decadente?'. Sinceramente, não sei”.

Por isso, não acho que, no fim das contas, a existência de Round 6 tenha sido em vão. Podemos manter viva em nossas memórias a primeira e primorosa temporada, e simplesmente esquecer tudo o que veio depois. Apesar da sensação de tempo perdido, não me arrependo de ter assistido à última temporada. E provavelmente perderei ainda mais do meu precioso tempo quando o remake americano for lançado — apenas e exclusivamente porque David Fincher está envolvido.

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