Quando falamos dos mentores do terror, John Howard Carpenter se destaca: uma tela salpicada de tons macabros e um recipiente de estranheza enigmática. Enquanto "maestros do terror" como George Andrew Romero se envolviam em fantasias apocalípticas com zumbis, David Lynch explorava reinos surrealistas destruindo a lógica e Dario Argento tecia sua própria tapeçaria de melancolia e estética gótica, Carpenter tinha seu próprio canto único no reino do terror.

Ecos dos horrores da infância
Se fosse pintar um retrato das imagens mais assustadoras da infância, sem dúvida apresentaria um psicopata, aparentemente indestrutível, empunhando uma faca e usando uma máscara sem olhos. Essa imagem tem origem em filmes de terror dos anos 1970 – a série Halloween, mais especificamente – tudo planejado pelo engenhoso Carpenter.

Para aficionados por filmes B e adoradores do gênero, Carpenter é um nome que dispensa apresentações. Ele não é o cantor de “Yesterday Once More”, mas um personagem curioso que administra uma biblioteca do bizarro e do grotesco. Além dos elementos arrepiantes e da ficção científica, tem uma propensão para tecer um humor sombrio e absurdo.
Carpenter é um verdadeiro prodígio no mundo do cinema – da produção à direção, da escrita à fotografia, da edição à atuação, da arte ao som, ele consegue dominar sozinho todos os aspectos.
O som da música
O fascínio de Carpenter pela música começou cedo. Seu pai era professor de música e, sob sua orientação, aprendeu violino. Quando a invasão britânica atingiu a costa americana em 1964, Carpenter se sentiu atraído pelos Beatles e, em particular, pelos teclados e guitarras. Na universidade, até tocou baixo em uma banda, mas sua paixão pelo cinema era tão profunda quanto pela música.
O ano de 1956 marcou um momento crucial para Carpenter. Aos 8 anos, ficou abalado pela ópera espacial Planeta Proibido, o primeiro filme a contar com uma trilha sonora totalmente eletrônica, composta pela dupla norte-americana Bebe e Louis Barron.


Em 1968, Carpenter matriculou-se na Escola de Cinema da Universidade do Sul da Califórnia, onde esteve envolvido como estudante na produção do curta-metragem The Resurrection of Broncho Billy. Ele assumiu vários papéis na produção do filme – roteiro, edição e composição musical – que acabou levando o Oscar de Melhor Curta-Metragem.

O primeiro longa-metragem de Carpenter, Dark Star, foi criado com um baixo orçamento ao lado de seu colega Dan O'Bannon, e mostrou seu talento para a ficção científica. Seu próximo empreendimento, Assalto à 13ª DP, marcou uma virada em sua carreira – a produção independente foi reconhecida no Festival Internacional de Cinema de Chicago e no American Film Institute, aclamado como um "poema do pesadelo" que expôs a irracionalidade e a violência descontrolada da sociedade.




Seu próximo projeto foi um verdadeiro ponto de virada: Halloween (1978) recebeu um investimento de 325 mil dólares, valor considerado alto para uma produção independente na época. O filme foi rodado em apenas 21 dias e arrecadou mais de 70 milhões de dólares nas bilheterias de todo o mundo.

Um dos aspectos mais emblemáticos de Halloween foi a trilha sonora misteriosa de Carpenter, que ficou gravada na história do cinema. Apesar de não ter ganhado nenhum prêmio importante, abriu caminho para uma nova abordagem de filmes de terror e conquistou seu lugar como um clássico do cinema de terror pós-moderno.
Um afeto pelo impensável
Para aqueles que adoram no altar dos filmes cult, especialmente aqueles que gostam de terror, O Enigma de Outro Mundo é um nome familiar. A ficção científica de Carpenter de 1982 está repleta de elementos que adorava – formas de vida desconhecidas, criaturas parasitas, gritos histéricos, animais ansiosos, suspeita entre os humanos e um final incerto – e que se fundem em um grande filme e em um grito arrepiante que emerge do “desconhecido”.


Outra obra-prima no repertório de Carpenter é À Beira da Loucura – um filme que utiliza elementos psicológicos para criar medo, pois contém violência mínima e visuais perturbadores. Ele evoca seres colossais do mundo antigo para representar o “horror indescritível” central na cultura Lovecraftiana. A guerra psicológica do filme cativou muitos espectadores, principalmente pela representação impecável do protagonista neurótico interpretado por Sam Neill.


Em seu filme de 1998, Eles Vivem, há uma conexão que é evidente, mas não imediatamente aparente: o slogan “Obedeça” – “Obey”, no original em inglês – está ligado à OBEY, uma campanha de arte de rua iniciada por Shepard Fairey. Ele pretendia despertar a curiosidade, fundindo-a com a fenomenologia de Heidegger e se inspirando nos filmes de Carpenter para lançar um experimento de mídia de rua: "Obey!". Inicialmente intitulada “André the Giant Has a Posse”, a campanha de adesivos, que traz a imagem de André, o Gigante, com a palavra OBEY, cresceu e abrange uma ampla gama de manifestações – de decalques em vitrines de lojas e outdoors grandes a grafites em paredes, OBEY se tornou onipresente. Muito parecido com os filmes de Carpenter, o objetivo era fazer com que as pessoas questionassem o que estava ao redor, despertando curiosidade. Durante quase duas décadas, pessoas em todo o mundo se tornaram involuntariamente sujeitos desta experiência.


O retorno de um pioneiro ao cenário musical
No século XXI, Carpenter assumiu uma semi-aposentadoria, voltando a suas raízes na música eletrônica. Embora o cinema tenha se tornado sua vida, ele redescobriu o amor pelo mundo musical que inicialmente o inspirou; embarcou em turnês, frequentou grandes festivais de arte e fez shows ao redor do mundo.

Mas as trilhas sonoras continuaram sendo a base da fonte criativa de Carpenter. Ele foi atraído pelos sintetizadores e seus sons minimalistas e psicodélicos, que complementavam perfeitamente a atmosfera peculiar que pretendia criar em seus filmes. Carpenter mergulhou na experimentação com sintetizadores eletrônicos, estética de colagem, atonalidade e o desafio da música experimental; usou sua música para se manifestar contra questões sociais, inspirando vários produtores com sua orquestração mecânica e melodias emocionalmente saturadas.

Depois de lançar dois álbuns como músico, Carpenter trouxe o passado ao presente com "Classic Themes Redux", um EP contendo novos arranjos de quatro temas icônicos de suas trilhas – Halloween, Fuga de Nova York, Assalto à 13ª DP e A Bruma Assassina – que serviu como uma retrospectiva de suas carreiras cinematográficas e musicais, gravada em um vinil de 12 polegadas pela Sacred Bones Records.

Em sua personalidade de músico, é frequentemente convidado para se apresentar em festivais internacionais – por exemplo, no Iceland's Tomorrow’s Parties Festival, não apenas tocou faixas de seu álbum, mas também apresentou suas trilhas clássicas. A fascinação de Carpenter pela música eletrônica é simples – é poderosa, minimalista e algo que pode criar inteiramente por conta própria. As qualidades dos sons de sintetizadores, as notas misteriosas que podem produzir e as emoções estranhas que evocam são incomparáveis em outros gêneros.

Tanto no cinema quanto na música, Carpenter tece notas desconcertantes, emprega uma linguagem de sombras para revelar monstros à espreita e expõe as verdades cruéis escondidas sob o verniz da sociedade.




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