Sem nenhum aviso prévio, Josh O'Connor excluiu sua conta do Instagram.
Para um astro do cinema em ascensão, isso desafia a lógica: nos últimos anos, Josh se tornou um dos jovens atores mais observados em Hollywood. Suas atuações em The Crown e em filmes como Reino de Deus, La Chimera e Rivais foram tão surpreendentes que ele até está sendo cogitado para a categoria Melhor Ator Coadjuvante do Oscar por este último. E sua agenda está repleta de projetos com diretores de primeira linha — Luca Guadagnino, Steven Spielberg, Rian Johnson, Kelly Reichardt — que já o contrataram como protagonista de seus novos filmes.
Então, o que deu errado?
Tudo começou no final do mês passado, durante uma sessão de fotos da Vanity Fair. Para a edição de Hollywood da revista, dois astros britânicos em ascensão — Josh O'Connor e Jonathan Bailey — foram colocados juntos. Um deles é abertamente gay, enquanto o outro já interpretou uma gama de personagens homossexuais sem esclarecer publicamente sua própria orientação sexual. Naturalmente, quem estava fotografando solicitou que eles posassem de forma íntima, mostrando ao público o que supostamente queriam ver.
Quando a dupla terminou de posar para uma foto abraçados, Jonathan, ainda saboreando o momento, encostou-se em Josh, parecendo satisfeito; Josh, por outro lado, parecia “nervoso” e fez um leve gesto, como se quisesse afastar Jonathan.
Esse movimento durou menos de meio segundo, mas foi suficiente para causar um alvoroço na internet. Um grupo de fãs expressou sua decepção, classificando Josh como um ator "gay for pay": interpretando uma série de papéis gays só para ganhar a simpatia e o desejo dos fãs LGBTQIA+, mas essencialmente só um homem heterossexual aproveitando de sua sexualidade ambígua para obter lucro, enganando os espectadores queer.
Um tweet irônico com essas afirmações atraiu imediatamente mais de um milhão de visualizações e quase duzentas mil curtidas. Nas respostas, os memes se multiplicaram, acusando Josh de queerbaiting — aquele que se beneficia de interpretar personagens gays quando, na verdade, é o mais heterossexual possível.
Não dá para ter certeza se esse é o motivo pelo qual Josh encerrou sua conta, talvez ele simplesmente tenha se cansado do assédio dos fãs; mas podemos ter certeza de que a narrativa pública — a recente onda de críticas dos fãs queer — não o ajudará em nada.
Então, como devemos entender esse incidente?
Primeiro, vamos esclarecer: Josh, de fato, interpretou vários personagens gays.
Os papéis mais inesquecíveis foram o fazendeiro reprimido Johnny em Reino de Deus e sua participação especial como James em Peaky Blinders. Mas isso não é tudo: em The Colour of His Hair, Hide and Seek e Rivais, ele interpretou papéis gays ou, pelo menos, bissexuais. Em seu próximo filme, The History of Sound, ao lado de Paul Mescal, ele interpretará mais uma vez a metade de um casal gay; e em Separate Rooms, de Guadagnino, ele também está escalado para um personagem gay. Ele até escreveu um filme com temática gay chamado Bonus Track.
É uma lista bastante extensa e, mesmo assim, Josh já disse em entrevistas que interpretar papéis gays “não é fácil” para ele. Não é de se admirar que os fãs queer se sintam em conflito: quem quer ver um homem (provavelmente) heterossexual, incapaz de abraçar e afirmar com confiança a orientação de seu personagem, assumir um papel gay?

As críticas de queerbaiting se alinham com a recente onda de empoderamento de grupos minoritários em Hollywood. Há vários anos, Scarlett Johansson teve que desistir de interpretar uma protagonista transgênero devido aos fortes protestos da comunidade trans. Do ponto de vista deles, preferem não ver nenhum filme com o tema a ver um que os represente de maneira inadequada.
Adicionando essa questão ao longo histórico de Hollywood de retratos duvidosos de minorias, podemos entender melhor a insatisfação da comunidade queer com determinadas escolhas de elenco e narrativa. Todos nos lembramos da tradição do blackface, em que atores brancos se pintavam para interpretar afro-americanos; Christopher Lee e outros usavam maquiagem para criar “olhos puxados” e retratar asiáticos. As comunidades negras e asiáticas lutaram muito para acabar com essas práticas e, com o tempo, esperamos que ter atores gays interpretando papéis gays e trans interpretando papéis trans se torne uma prática padrão.
Mesmo assim, devemos nos lembrar de que a atuação não é uma réplica da realidade, mas uma interpretação artística. Esse processo necessariamente concede um espaço privado ao ator e exige a suspensão da descrença do público. Se quisermos saber tudo o que está por trás das câmeras e dissecar todos os aspectos da vida privada do ator, onde fica o espaço para a magia?
Pessoalmente, não me importo muito com a orientação sexual real de Josh O'Connor. Esse é um assunto particular dele (e espero que ele não se sinta compelido a revelar detalhes à mídia). O que me interessa é saber se ele é um bom ator. E a resposta é obviamente sim.
Não assisti a muitos de seus trabalhos, mas o suficiente para apreciar sua versatilidade. Ele consegue ser vulnerável e teimoso, como em La Chimera, e arrogante e convencido, como em Rivais. Ainda assim, independente dos papéis, há um ponto em comum: por trás dos personagens, vemos uma alma extremamente sensível e perceptiva, e uma alma como essa precisa de proteção.
Até certo ponto, entendo a insatisfação dos fãs LGBTQIA+, mas também espero que as pessoas não escrutinem demais sua vida particular. Espero que, em meio a essa tempestade de opinião pública, Josh possa fortalecer seu equilíbrio emocional sem perder sua sensibilidade única.
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